Nas fábricas do Maya, (leia-se ilusão, fantasia, vida fútil) as festas
onde corpos e sorrisos se espalham na exibição do pavoneamento, ato intrínseco dos sujeitos feminino e masculino,
ali um ambiente de mostra da sexualidade se inscreve. Mais adiante é possível
ouvir conversas sobre o sexo. A mulher segura de si, com o corpo trabalhado por
musculação e um olhar direcionado para cima, acima de todas as pequenas que a
cercavam, sentenciava: "com ele era ótimo, sem ele é muito melhor"...
"me amo muito mais que amo ele, a gente tem que estar bem para atrair
pessoas legais...". Antes ouvia-se o homem maduro, o que se diz homem de
verdade, ele dizia que as coisas estão confusas, reclamava que a mulher hoje
perdeu seu lado feminino, o que se confundia com a ‘submissão’, que na visão
dele encantava, que hoje ela só quer competir e que o auge seria querer mostrar
através do dinheiro-poder que ela era independente, e que não precisava de
nenhum homem. Para ele isso refletia na verdade uma insegurança, e continuou
sua análise usando mil exemplos, parecia até uma mulher falando de suas lutas
para conseguir ser competente em tudo e ainda poder "chegar junto" em
termos materiais com o parceiro.
No terreno da psicanálise, onde pesquiso de forma despretensiosa, já que
minha formação é completamente outra, encontrei alguns artigos sobre a questão
da mulher e da sexualidade, é surpreendente como a natureza feminina cria bases
na esfera do imaginário, onde planta, semeia e cultiva sua visão de mundo,
expectativas, frustrações. E o repertório das frustrações - quase inevitável
quando se coloca o imaginário regendo tudo, é que mais que uma pulsão, se torna
uma forma de masoquismo direto ou indireto, indireto quando é através dele que
se legitima o lado "feminino" do deixar de ter para
ser (pertencendo ou ser o outro - do homem)
“O homem serve aqui de conector para que uma
mulher se torne Outro para ela mesma, como o é para ele” - Lacan
Impressionante como a mulher se recalca (talvez na falta do falo,
na erotomania) e constrói um repertório de (des)construção de si mesma
para então Ser - no fundo para pertencer, se torna o "objeto
maltratado" do homem que ela ama, e é justamente no amor que ela deposita
todas as falhas do Real, aquilo que seria o "todo" mas que é
invisível em detrimento de uma necessidade de Ser para o Outro.
Laurent observa que no campo
amoroso, a mulher pode enveredar pelo caminho de ser tudo para ele, e pode ir
muito longe nisso. O primeiro passo consiste em perder (para ser,
perder ter) tal qual na prática do Potlatch (prática tribal onde o
ato de dar tudo, renunciar todos os bens que se tem, de forma irracional é tido
como honra para o homenageado, vide Mauss). Mas, por alguma contingência, ela
pode começar a se questionar sobre o que quer nessa parceria / relacionamento e
perceber que não é nada para o outro, e que seu único lugar reservado seja o de
objeto maltratado. Quando isso ocorre sua posição subjetiva nessa parceria
deixa de ter seu lugar.
A mulher busca a palavra de amor para isolar um significante que
"edifica" o seu ser, uso aspas por se tratar de uma esfera do
simbólico. É pela via do amor que ela abre perspectiva de se fazer toda, de
achar um significante justamente onde o significante não existe ou responde.
Essa demanda (do amor) é colocada no lugar do significante cumprindo uma
função de suplência, o que pode e certamente trará riscos, pois a mulher
passará a ser mais dependente dos signos do amor vindos do objeto amado, e isso
pode torná-la mais vulnerável a qualquer tipo de concessão, são as mulheres da
devoção.
Lacan, Freud, Laurent, Mauss, dentre outros, falam
dessa dimensão sexual e amorosa da mulher focando em oposição ao homem - que
teme a castração, na mulher o temor viria da privação - de algo que eles chamam de uma certa inveja do
pênis (?!) no sentido de achar um substituto para o falo - esse termo, privação, vem
acompanhado dos termos castração e
frustração. Seria
uma falta de algo que poderia estar alí, é a privação no campo do simbólico.
Diante de tamanha complexidade que varia de forma e
lugar em acordo com de onde se diz, o ato de pensar as relações nos dias atuais se
torna quase um ato estéril, já que não existe uma ou umas explicações que possam
"dar conta" de resultados,
no sentido de elucidar questões que possam clarear as articulações ocorridas no
encontro com o outro - em um relacionamento, seja ele de que proporção for.
Esse enunciado me faz refletir sobre o quão pequenos somos, e o quão
prepotentes também, me recolho na insuficiência da explicação e no vazio de
estar falando em "eco", pois poucos entenderão minha voz - é muito
mais simples a gente fechar os olhos e repetir como mantras as regras de um bom
convívio... Mesmo que esse seja coberto por práticas hipócritas, mesquinhas,
preconceituosas... É muito mais fácil, tanto para o homem, quanto para a
mulher, ser cego na razão, adotar posturas inscritas pelas gerações passadas e
adicionar as novas e confortáveis posições dogmáticas em que o homem passa a
escolher o que quer de uma mulher e vice-versa, deixando de lado tudo que os
faça entrar em contato com o REAL - o real é traumático, e vivemos na era do
gozo, do líquido, da efemeridade das relações, que se constroem e destroem como
um capítulo de novela, recheadas de paixão frívola, de superficialidade, medo
de olhar pra dentro e assumir sua própria estupidez, medo de olhar pro
lado e assumir sua mesquinharia, egoísmo egoico, nem um pouco fundado nos
preceitos espiritualistas aos quais nós, os sujeitos sociais, os porta vozes da
sociedade civilizada, culta, progressista, elegemos como bandeira última de
nossa existência, a finesse, o ser do bem, o ser de Deus, não passam de rótulos
para dizer nada sobre os atos reais - só
serve para justificar nossa preguiça de pensar, de sermos justos e corajosos na
vida, no amor e também na materialidade.
JM.:
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